21.4.04

Olfacto ou literatura ?

A escritanamesa de Manuel Carvalho e David Lopes Ramos, a propósito de uma prova de “excelentes” colheitas onde foram testados 42 vinhos, publicada no Fugas de 17 de Abril deste ano: “ (...) o de 1990 ostenta ainda uma cor carregada e aroma fechado; o de 1991 é um vinho fresco, com notas de compota de frutos pretos e passas de figo; (...) Finalmente, os “colheitas”, com vinhos que nos comovem, como os de 1890 (engarrafado em 1977), de 1900, 1920 e 1922, frescos, com graus diferentes de secura e notas meladas, muito ricos; outros que nos surpreendem pelo grau de qualidade, com destaque para os de 1937, 1940, 1955 e 1963, com as suas notas de torrefacção, frutos secos, mel e álcool doce e um fim de boca que nunca mais acaba. Desilusão só a colheita de 1970, com notas esquisitas de enxofre e borracha queimada.”

Será esta escrita objectiva ou pura literatura ?

18.4.04

Buffet

Luis Fernando Verissimo é um escritanamesa de muito interesse. No seu livro mais recente "A mesa voadora" da Dom Quixote explica em várias lições como atacar uma mesa de "buffet". Aqui vai um excerto:

"Estude o terreno - O planejamento é importantíssimo. Ao entrar na festa, examine cuidadosamente o buffet. Resista à tentação de começar a botar camarões no bolso. Isto é apenas um reconhecimento.
Decore a localização dos pratos mais importantes. Geralmente há 17 tipos diferentes de salada de batata. Concentre-se numa para não perder tempo depois.
Faça uma anotação mental do melhor acesso à lagosta, se houver. Lembre-se de que dois ou três pedaços de lagosta valem uma travessa de peito de perú em qualquer mercado de valores do mundo. Decida-se por uma estratégia de ataque. Se preciso, estude uma ação diversionista. Na hora de avançar, diriga-se resolutamente para os embutidos e, à última hora, desvie rapidamente para a lagosta, confundindo o inimigo."

16.4.04

Obesidade e genética

Vai-se ouvindo aqui e acolá quando se fala em obesidade do papel dos determinantes genéticos nesta situação. Por exemplo, a obesidade é devida a um conjunto de factores em que o factor genético tem um papel importante. Este discurso mediático culpabilizador do indivíduo que "não teve sorte com os seus genes" tenderá a ser mais visível nos próximos tempos por parte de alguns actores da área alimentar.

As características genéticas poderão predispor, algumas pessoas mais do que outras, para a obesidade. No entanto, o que se sabe actualmente é que o factor calórico é o determinante essencial do aumento da obesidade nos países ocidentais. Em especial quando o preço e a disponibilidade de certas matérias primas como o açúcar e os óleos vegetais passaram a permitir o seu uso generalizado na alimentação humana. O combate à obesidade passará essencialmente, na minha opinião, pela disponibilização de alimentos de grande qualidade nutricional (como hortícolas e fruta, por ex.) a preços acessíveis a toda a população e na capacidade das forças políticas entenderem que o investimento no consumo destes produtos é um investimento económico na sociedade.

15.4.04

Acrilamida II

Continuamos atentos ao que se escreve sobre este assunto. O suplemento semanal dos Diários de Coimbra, Aveiro, Leiria e Diário regional de Aveiro refere na sua edição de 2 de Abril que "Os alimentos com acrilamida motivam discordância científica". Como vê o público este assunto ? Gostava de saber qual a opinião dos leitores quando se expõem apenas os factos com estudos contraditórios. Será que esta informação imparcial mas confusa para o leitor é a mais interessante ? Colocadas as dúvidas da ciência perante factos novos ainda em investigação qual a reacção dos leitores ? Será este tipo de informação útil ?

Estas questões são ainda mais importantes quando hoje existe uma necessidade enorme de lançar temas novos nos meios de comunicação social e, por outro lado, são estes temas os que mais assustam e preocupam os leitores. Esta pressão irá manter-se no futuro. A necessidade de divulgar potenciais malefícios ou benefícios para a saúde decorrentes da ingestão alimentar em áreas pouco conhecidas será crescente e baseada em evidência científica de fraca qualidade. Como reagir a esta situação ?

14.4.04

A Associação Portuguesa dos Nutricionistas (APN) alerta para o facto de existirem no nosso país " diversas situações de má prática na área da nutrição, levadas a cabo por pessoas que não estão devidamente habilitadas para tal e que colocam em causa a saúde pública, os interesses dos consumidores, bem como a imagem profissional dos nutricionistas". Concordo totalmente e acho que face à desregulamentação existente (o consumidor deve estar atento... é o que se diz...) o melhor mesmo é a classe reagir e apontar casos de má prática. Não creio que seja corporativismo. Face à falta de fiscalização e de orientação nestes casos, a classe deve estar unida. Por falar em má prática, continuam as más práticas comunicacionais, agora na revista Vogue de Março 2004, com o artigo "Alimentos que curam - Será que o salmão e as nozes substituirão o Xanax e o Prozac ? "
O tema até poderia ser interessante, mas no fim ficamos com a impressão de que o consumo regular de salmão, de ovos fortificados com ómega-3 ou ainda de azeitonas, pode ser a solução para tratar depressões. Curamos a depressão e morremos ainda mais de AVC devido ao sal das azeitonas. Curamos a depressão e deixamos o pescado da nossa tradição rico em ómega-3 (sardinha, cavala...) para passar a consumir salmão importado e alimentado a ração. Será que não existe outra forma sensata de pegar no assunto ? Porque importamos estas traduções sem relação com a realidade Portuguesa ?

MENOS PLÁSTICO

O jornal Globo analisa a utilização de sacos de plástico nos supermercados e o que se está a fazer na Austrália para combater este problema. Este é um custo ambiental relacionado com a compra de alimentos nos supermercados. E em Portugal não podemos fazer nada ? Entretanto, chamo a atenção para os excelentes jornais brasileiros disponíveis on-line e em Português....

" O ministro do Meio Ambiente da Austrália, David Kemp, disse que os supermercados do país devem atingir a meta de redução de uso de sacolas de plástico em 25% até o fim deste ano. Kemp observou que a redução nos poucos meses desde que o compromisso foi assumido já chegou a 12%. Segundo a GreenBiz, a diminuição é resultado de um pacto voluntário entre o governo e o setor, e gerou o Código de Práticas do Varejo. Desde sua adoção, em outubro de 2003, o acordo já foi firmado por 90% dos supermercados australianos, que vêm conduzindo campanhas de educação de consumidores e funcionários, incentivando a adoção de sacolas reutilizáveis. O artigo informa que mais de 50% das 6,9 bilhões de sacolas plásticas usadas na Austrália estão em supermercados."

8.4.04

O escritanamesa vai de fim de semana Pascal. Regressamos já, já. Tenham uma boa Páscoa.
Já me esquecia... A propósito deste projecto, a Comissão Europeia enviou um press release com um resumo dos dados. Pelo menos, um jornal de referência deu no dia seguinte grande destaque ao assunto mas, infelizmente, os jornalistas envolvidos não contactaram os autores do projecto (cujos contactos eram fornecidos) nem fizeram qualquer referência a quem o desenvolve. Limitaram-se a um copy past do press release perdendo assim parte do mais importante que poderia ser dito. Mais tarde e felizmente, os jornalistas da Rádio Comercial e Jornal de Notícias tiveram um comportamento diferente, revelando qualidade e maturidade profissional.

Trustinfood

O nosso projecto Trustinfood continua na ordem do dia. Em colaboração com outros países Europeus, estamos a analisar as condições necessárias para que exista confiança na alimentação e nos alimentos em particular. Entre outros dados interesantes, reparámos que nos países onde existe um maior nível de confiança nos alimentos existe também mais confiança nas instituições que regulam a qualidade dos alimentos. Ou seja, quem quiser aumentar a confiança dos consumidores nos alimentos, em vez de se preocupar tanto com os alimentos, atribuindo rótulos, etc... devería dar mais atenção a quem faz o quê no sistema e como. Ou seja, a chamada public accountability, palavra para a qual não existe uma tradução em Português. Já agora, quem quiser saber mais sobre o projecto pode visitar a página do Trustinfood.

5.4.04

Sigamos o Cherne

Com a poesia aprende-se a arte de comprimir palavras sem perder o norte. O que vem mesmo a calhar para quem é candidato a divulgar ciência de forma simples e rigorosa.

Alexandre O'Neill, o mais subversivo poeta português, deixou-nos uma série de escritanamesa sobre animais e comidas que por vezes me apetece recordar. Este cherne é de 1958, do tempo da outra senhora (por favor, não fazer confusões...):

Sigamos o cherne, minha Amiga !
Desçamos ao fundo do desejo
Atrás de muito mais que a fantasia
E aceitemos, até, do cherne um beijo,
Senão já com amor, com alegria...

Em cada um de nós circula o cherne,
Quase sempre mentido e olvidado.
Em água silenciosa de passado
Circula o cherne: traído
Peixe recalcado...

Sigamos, pois, o cherne, antes que venha,
Já morto, boiar ao lume da água,
Nos olhos rasos de água,
Quando, mentido o cherne a vida inteira,
Não somos mais que solidão e mágoa...
Não vejo qualquer reacção a esta notícia. A maior parte dos Portugueses também não lê o Público.

4.4.04

BSE: Sistema português de identificação de bovinos sem aprovação de Bruxelas

Notícia da Lusa no Público on-line de Domingo:

"O sistema de identificação de bovinos português, criado na sequência do combate à encefalopatia espongiforme bovina (BSE), funciona há mais de quatro anos sem ter sido aprovado pela Comissão Europeia, revela o bastonário da Ordem dos Veterinários.
(...) O Sistema Nacional de Identificação e Registo de Bovinos (SNIRB), criado pelo governo socialista, é uma base de dados onde devem ser introduzidos todos os passos do animal, desde o seu nascimento até ao prato do consumidor. "O SNIRB é uma base de dados que deveria estar aprovada pela União Europeia. Não está porque a Comissão não considera que existam condições para a aprovar e tem havido visitas frequentes de peritos", comentou o bastonário Cardoso Resende."

Esta notícia deverá (deveria) ser comentada na segunda-feira pelo Ministério da Agricultura (MA) mal este abra as portas, às 9.00 da manhã. Ou talvez não. Vamos esperar... e ver como o MA vai lidar do ponto de vista mediático com este ataque (mais um) à confiança dos consumidores no sistema.


3.4.04

Inovação

Decorre durante este fim de semana na Exponor a feira Alimentação 2004. Quem quiser assistir à construção do mercado alimentar ibérico poderá ver como ele já se definiu. Paralelamente, decorreram diversos seminários interessantes na Sexta-feira e no Sábado (2 e 3 Abril). A palavra inovação aparece em todas as empresas do ramo as quais repetem continuadamente que sem inovação não é possível criar novos produtos agora que surgem novas necessidades. O problema na inovação alimentar prende-se com o tempo. Um exemplo? Adicionaram-se anti-oxidantes a tudo quanto era alimento sem qualquer regulação. Sumos com Vit. C, Cereais com Vit E, mais Selénio, Zinco e Betacarotenos em diversos alimentos. Por vezes, adicionaram-se estas vitaminas e oligoelementos a alimentos pobres que continham açúcar e pouco mais (sumos, cereais de pequeno-almoço...), apenas para lhe acrescentar valor. Ora os seres vivos possuem sistemas anti-oxidantes naturais, compostos por diversos enzimas, que ao receberem quantidades ocasionais e elevadíssimas destas substâncias adicionadas aos alimentos, poderão originar efeitos contrários, aumentando por exemplo a própria oxidação que se pretendia inibir. Neste momento desenvolvem-se investigações nesta área e existem indicações neste sentido. Qual o impacte da ingestão continuada de alimentos enriquecidos em anti-oxidantes no futuro ? Um cancro pode levar 10 anos a se desenvolver. Como avaliar o efeito desta inovação ?

1.4.04

Ingestão tardia de poucas calorias prolonga a vida

"ESTUDO
Ingestão tardia de poucas calorias prolonga a vida
A ingestão de poucas calorias prolonga a vida em qualquer idade. Um estudo norte-americano mostra que a redução da quantidade de calorias consumidas parece prolongar a vida dos ratos, mesmo quando essa redução ocorre tardiamente.
(...) Os resultados em ratos de laboratório permitiram à equipa da Universidade da Califórnia acreditar que nos humanos, seja qual for a idade, os benefícios podem ser idênticos basta que se comece a cortar nas calorias ingeridas a partir da próxima refeição."


Porque razão não existe bom senso e qualidade na escrita jornalistíca sobre temas delicados como este ? Quem ler este artigo poderá pensar que comer menos significa maior longevidade. O texto vem de um site de referência. Muitos dos nossos idosos comem menos do que deviam e com pior qualidade do que deviam. Qual o impacte destas notícias ? Quem as regula ?

E na área da nutrição ?

Para melhorar a vossa capacidade de fazer pesquisa na net aqui fica este interessante teste. Para quando uma coisa destas sobre nutrição e alimentação ?